sexta-feira, novembro 14, 2008

Planetas e Desplanetas (I)

Primeiro peço desculpa por não actualizar o meu blog (e a sua tradução para inglês) há imenso tempo.

Gostava de explicar aqui a minha insatisfação com a definição actual de planeta. A definição em uso foi aprovada pela União Astronómica Internacional (UAI) em 2006. A data não foi escolhida ao acaso, foi sim uma reunião de emergência (digo eu) para não classificar Éris como planeta (Éris foi anunciado em 29 de Julho de 2005).

A definição prévia de planeta (não oficial) era simplesmente:
a) Orbita uma estrela
b) Não é uma anã castanha ou estrela nem outro corpo celeste de grande massa
c) É maior que Plutão

Durante 75 anos nenhum objecto no Sistema Solar, para além dos planetas tradicionais e Plutão, cumpriu estes requisitos. As descobertas de Quaoar (2002) e Sedna (2003) chegaram a ser anunciadas como a descoberta do "décimo planeta" no entanto várias entidades rapidamente retiravam força a essa afirmação, baseando-se no princípio que estes eram menores que Plutão. No entanto a descoberta de cada vez mais corpos celestes na cintura de Edgeworth-Kuiper anunciava o que se passaria a seguir...

Nestes 75 várias outras descobertas puseram a definição de planeta à prova. Nos anos sessenta van de Kamp propôs a existência de planetas na Estrela de Barnard (uma das estrelas mais proóximas do Sol), ou seja, pela primeira vez foi proposto o nome planeta para corpos fora do Sistema Solar. Análises mais tarde não mostraram a existência destes planetas. No entanto a marcha dos planetas extrasolares continuou. Em 1988 Campbell, Walker e Yang propuseram a existência de um planeta em volta de Gamma Cephei, sendo este só confirmado em 2003. Em 1991 e 1992 foram propostas existências de planetas em torno de pulsares. No entanto a comunidade científica mais céptica da existência de planetas extrasolares só foi estilhaçada em 1995 com a descoberta categórica do 51 Pegasi b (ao lado representação deste planeta e da sua estrela 51 Pegasi). Desde aí a descoberta destes planetas tem aumentado todos os anos. Quando as técnicas de detecção permitirem a descoberta de planetas de menor dimensão penso que se mostrará que a esmagadora maioria das estrelas tem planetas.

Voltemos à questão da definição de planeta. Em 2005 o anúncio de Éris criou imediatamente ondas de choque. Ao contrário de Quaoar e Sedna, Éris era maior que Plutão. Pela definição não oficial vigente este era um planeta. Não percebo as razões porque tiveram tanta relutância em aceitar esta classificação. Entendo que muita gente não quisesse aumentar muito o número de planetas já que a existência de mais corpos maiores que Plutão é bastante provável. No entanto, para tal precisaram de fazer algo que muitos acusam de blasfémia: se Éris não é planeta, Plutão também não o é. Como símbolo desta classificação (humilhação dizem alguns) foi dado o número de asteróide a Plutão (134340). Curiosamente esta não é a primeira vez que um planeta é despromovido: já tinha acontecido o mesmo com os maiores asteróidas de Cintura Principal.

A questão essencial aqui é se se considera Éris e os seus possíveis numerosos companheiros maiores que Plutão ou não considerar nenhum deles, inclusive Plutão. Na minha opinião a existência de 10, 20 ou 30 planetas não iria causar problema nenhum e iria ser aceite com naturalidade. Obviamente que nas escolas nenhuma criança iria ser obrigada a decorar o nome desta legião de planetas, tal como nenhuma é obrigada a decorar o nome das dezenas de satélites naturais planetas tradicionais (só Júpiter tem um harém de mais de 60 luas). O mesmo se aplica a outras situações. Para mim a procura do baixo número de planetas não passa de uma imposição dogmática da UAI.

A desclassificação de Plutão (ao lado a melhor imagem actual de Plutão) tem efeitos severos, começando pela própria interrogação sobre o poder da UAI para julgar algo que muitas pessoas tinham no seu íntimo como planeta (incluindo muitos astrónomos da UAI). Se a UAI regula a definição de planeta, quem regula as definições da UAI? Até a NASA está a sofrer as consequências já que a sonda New Horizons, que está neste momento a caminho de Plutão, e numa perpectiva emocional, perdeu importância. Em vez de ir visitar um planeta vai visitar mais um dos imensos asteróides do Sistema Solar.

Para muita gente (como eu) parece estar à vista que a UAI, que durante tanto tempo considerou Plutão um planeta de direito, agora decidiu excluí-lo apenas pela existência de Éris e companhia e não pelas suas características. Parece que esta definição científica (que era necessária) foi forçada pelo dogma e não por necessidade ou responsabilidade científica... Criou-se agora um ambiente em que Plutão não é um planeta de jure mas é um planeta de facto...

Num futuro post (próximo, prometo!) falarei da definição de planeta que saiu da reunião e das suas outras consequências.